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O Mestre (2012), de Paul Thomas Anderson (Review)

  • Foto do escritor: Ricardo Orsini
    Ricardo Orsini
  • 20 de jun.
  • 3 min de leitura
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O Mestre, do aclamado diretor Paul Thomas Anderson (PTA), é uma imersão vertiginosa na psique fraturada da América pós-guerra. A trama nos apresenta a Freddie Quell (Joaquin Phoenix), um veterano da Segunda Guerra Mundial atormentado por seus impulsos violentos e um alcoolismo destrutivo. 

Errante e à deriva, ele encontra por acaso (pelo menos é o que parece num primeiro momento) Lancaster Dodd (Philip Seymour Hoffman), o carismático e eloquente líder de um movimento filosófico-religioso conhecido como "A Causa". 

Intrigado por Quell, Dodd o acolhe em seu círculo íntimo, prometendo-lhe cura e um propósito. O que se desenrola a partir desse encontro não é uma história de redenção, mas um brilhante e complexo ensaio sobre personagens profundamente ambíguas.

A relação entre Freddie e Lancaster é o coração pulsante do filme, uma dança magnética entre o instinto animal e o intelecto dominador. No entanto, Anderson se recusa a oferecer respostas fáceis.

Lancaster soa como um charlatão em diversos momentos, mas sua genialidade em conduzir as narrativas de seus pacientes durante as sessões de "processamento" é inegável. A Causa, que ecoa como uma espécie de Cientologia, é apresentada como uma seita, mas ao mesmo tempo, parece oferecer genuinamente respostas e um porto seguro para almas perdidas. 

Freddie, por sua vez, parece submisso à figura paternal de Dodd, mas em sua imprevisibilidade e recusa em ser completamente domado, revela-se o único personagem verdadeiramente livre de qualquer amarra.

Essa complexidade de personagens é amplificada pela maestria técnica de Anderson. 

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A escolha de filmar em 70mm não é um capricho estético, mas uma ferramenta narrativa fundamental. Os closes nos rostos de Phoenix e Hoffman ganham uma profundidade avassaladora, tornando cada poro, tique e olhar um universo de significados não ditos, o que só aumenta a ambiguidade do filme.

As tomadas lentas e longas, por sua vez, forçam o espectador a encarar o constrangimento e a tensão latente em cada cena, um inegável talento de PTA em vários de seus filmes. 

A edição do filme é também um convite à desorientação. Num primeiro momento, a história parece seguir um fluxo cronológico, com pequenas transições dando a entender que houve mudança de cena. Depois disso, as elipses parecem obedecer muito mais uma lógica simbólica e psíquica do que qualquer outra, criando uma sensação de sonho ou de memória fragmentada. 

A gravidez de Peggy (Amy Adams), a esposa de Dodd, que em um filme tradicional serviria como marcador de tempo, aqui parece flutuar, desobedecendo a uma lógica temporal clara e reforçando o papel dela não como esposa, mas como a verdadeira e implacável guardiã da ortodoxia da Causa.

Anderson dá aos seus atores uma autonomia radical para embarcarem no caos e na perda de controle de seus personagens, resultando em atuações viscerais e inesquecíveis. Informações de bastidores dão conta de que a cena em que Joaquin Phoenix quebra um vaso sanitário na prisão não foi planejada.

Outra camada profunda do filme é a primorosa trilha sonora de Jonny Greenwood. Longe de pontuar emoções, a música, cheia de dissonâncias e atonalidades, estabelece uma relação dialética com as imagens. 

Ela não nos diz o que sentir, mas gera a textura do filme: uma ansiedade constante, a sensação de estarmos à deriva junto com Freddie. Esse desconforto é brilhantemente contrastado pela irrupção de canções tradicionais e melódicas, muitas vezes cantadas pelos próprios personagens, que criam ilhas de aparente normalidade em um oceano de perturbação.

O Mestre é uma experiência sensorial e psicológica que desafia e perturba, consolidando-se como uma das obras mais enigmáticas e poderosas do cinema do século XXI.

FICHA TÉCNICA

The Master (O Mestre), 2012, EUA. Direção: Paul Thomas Anderson. Roteiro: Paul Thomas Anderson. Diretor de Fotografia: Mihai Mălaimare Jr. Música: Jonny Greenwood. Elenco principal: Joaquin Phoenix, Philip Seymour Hoffman, Amy Adams, Laura Dern, Rami Malek. Produtora(s): Annapurna Pictures, The Weinstein Company, Ghoulardi Film Company. Duração: 137 minutos. Idioma original: Inglês. Principais prêmios e indicações: Vencedor do Leão de Prata de Melhor Diretor e da Copa Volpi de Melhor Ator (para Phoenix e Hoffman) no Festival de Veneza; 3 indicações ao Oscar, incluindo Melhor Ator (Joaquin Phoenix), Melhor Ator Coadjuvante (Philip Seymour Hoffman) e Melhor Atriz Coadjuvante (Amy Adams).

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